13 de julho de 2016

Interpretação de texto "A Vila Rica dos Poetas"


Em 1780, um século após a descoberta das minas, Vila Rica já havia muito deixara de ser um acampamento mineiro embarrado e sem atrativos. Situada no sopé do grandioso penedo do Itacolomi, no sul de Minas, a cidade se constituía de uma teia de ruas pavimentadas percorrendo ladeiras íngremes, ladeadas por graciosas construções de dois pisos, muitas das quais possuíam terraços ajardinados e floridos. No topo das colinas, ou em frente a praças amplas e arejadas, havia inúmeras igrejas barrocas, com altares reluzindo em ouro e paredes repletas de ornamentações suntuosas. Não era uma cidade: era uma obra de arte urbana. Vila Rica, disse um poeta, era "a pérola preciosa do Brasil". 
Mas a riqueza da cidade  seu ouro preto, seus diamantes reluzentes, suas minas opulentas era também a fonte de suas desgraças. Submetida a uma sangria feroz, que se manifestava na forma de impostos de entrada e de saída (qualquer produto levado às minas era duramente taxado; cada grama de ouro que saía pagava um tributo oneroso), Vila Rica via sua fortuna se esvair. Levado para além-mar, o ouro de Minas permitiu a D. João V reinar numa luxuosa ostentação a ponto de se tornar conhecido como o Roi-Soleil português. O mais perturbador é que o "fulvo metal" nem sequer servia para enriquecer a Metrópole: era apenas o ouro "que Portugal distribuía liberalmente pela Europa", como observou o viajante inglês Henry Fielding. Nada mais natural, portanto, que a jovem sociedade mineira — tão diferenciada da elite rural e latifundiária do Nordeste — alimentasse um profundo estado de indignação e revolta. E essa revolta não duraria muito para eclodir. 
Pelo menos algumas vantagens Vila Rica conseguia auferir de sua opulência. Além de constituir uma sociedade essencialmente urbana, possuía uma estrutura bem mais complexa do que aquela que se reduzia a senhores e escravos. Havia uma "classe média": comerciantes, mercadores, ourives, artistas e, é claro, poetas. Outra possibilidade aberta pelo ouro foi a chance concedida a alguns filhos da elite local de realizarem seus estudos na Europa. De fato, muitos herdeiros de mineradores bem-sucedidos foram enviados para a Universidade de Coimbra, em Portugal. Lá, vários deles tomaram contato com ideias liberais e republicanas, acompanhando o furor provocado pela independência dos Estados Unidos. Um desses estudantes, José da Maia e Barbalho, chegou a entrar em contato com Thomas Jefferson, então embaixador dos EUA na França, sondando-o sobre um possível apoio norte-americano à independência do Brasil. 

BUENO, Eduardo. Brasil: uma história. São Paulo: Ática, 2003, p. 126. 

QUESTÕES DE INTERPRETAÇÃO **Gabarito no final**

1. O que quer dizer o autor com o seguinte enunciado no fim do primeiro parágrafo: [Vila Rica em 1780] "Não era uma cidade: era uma obra de arte urbana"

2. Por que o autor diz, no segundo parágrafo, que o ouro de Minas Gerais, embora abundante, nem sequer servia para enriquecer a Metrópole? 

3. Que vantagens a riqueza trazia para Vila Rica? 

4. Que reflexos teve no Brasil Colônia a ida dos filhos da elite mineira para estudos na Universidade de Coimbra no século 18? 

5. Não perca aspectos importantes do modo como o texto está construído. São três parágrafos: 

> no primeiro, o autor traça um retrato positivo de Vila Rica em 1780; 
> no segundo, relata os problemas que afetavam a cidade (as desgraças trazidas pela riqueza); 
> no terceiro, dá destaque às vantagens trazidas pela riqueza. 

Cada parágrafo começa com uma afirmação de caráter bem geral. É o que chamamos de frase-guia porque é ela que anuncia o tema do parágrafo e, ao fazer isso, dá o norte para a redação do restante do parágrafo. Note que cada parágrafo vai se constituir exatamente pelo desdobramento desta afirmação geral. Vamos analisar cada parágrafo. 

Primeiro parágrafo 
Frase-guia: 
"Em 1780, um século após a descoberta das minas, Vila Rica já havia muito deixara de ser um acampamento mineiro embarrado e sem atrativos". 

Sequência 
A afirmação geral é desdobrada em detalhes: o parágrafo vai justificar a afirmação geral, relatando por que Vila Rica já não era um acampamento mineiro embarrado e sem atrativos - faz referência ao traçado das ruas, às belezas das casas, aos seus jardins e às igrejas barrocas. E conclui com a afirmação de que Vila Rica não era uma cidade, mas uma obra de arte urbana. 

Segundo parágrafo 
Frase-guia: 
"Mas a riqueza da cidade - seu ouro preto, seus diamantes reluzentes, suas minas opulentas  era também a fonte de suas desgraças". 

Sequência 
O parágrafo vai listar as desgraças que a riqueza trazia para Vila Rica. 

> Quais são elas? E a que conclusão conduzem? 

Terceiro parágrafo 
Agora é com você: transcreva a frase-guia e descreva como o parágrafo a desdobra. 

Observe a transição dos parágrafos: 

> O primeiro, como vimos, é um retrato positivo da cidade. O segundo tem como tema as desgraças trazidas pela riqueza. Ou seja, o texto vai alterar sua direção do positivo para o negativo. E isso está sinalizado pelo autor com o uso da conjunção MAS. Vila Rica era uma obra de arte urbana. MAS tinha lá suas desgraças. 

> Depois de relatar as desgraças trazidas pela riqueza e de concluir pelo estado de indignação e revolta que existia na cidade como consequência dessas desgraças, o autor muda de parágrafo para tratar agora das vantagens trazidas pela riqueza. Note a expressão usada na transição: "Pelo menos algumas vantagens...". Ou seja: a riqueza trazia desgraças, mas nem tudo eram desgraças (pelo menos algumas vantagens havia). 


GABARITO

1. As riquezas e belezas de seus monumentos e traçado urbano transformavam Vila Rica numa obra de arte. 

2. Porque o ouro que Portugal tirava do Brasil era transferido para outros países da Europa para pagar os gastos suntuosos da corte portuguesa. 

3. O ouro favorecia o comércio e o artesanato em Vila Rica, constituindo, com isso, uma classe média. Permitia também que as famílias mais ricas pudessem enviar seus filhos para estudar na Europa.

4. Eles tomaram conhecimento dos ideais liberais e republicanos difundidos pela independência dos Estados Unidos e começaram a sonhar com a independência do Brasil. 

5. Frase-guia: "Pelo menos algumas vantagens Vila Rica conseguia auferir de sua opulência." E o parágrafo se desdobra com o detalhamento dessas vantagens: a existência de uma classe média, a possibilidade de enviar os filhos para estudar na Europa e, por meio destes, a divulgação dos ideias liberais e republicanos difundidos pela independência dos Estados Unidos.