Análise de soneto barroco - Ardor em coração firme nascido "Gregório de Matos" (antíteses)


Quis o poeta embarcar para a cidade e antecipando a notícia à sua senhora, lhe viu umas derretidas mostras de sentimento em verdadeiras lágrimas de amor.

Ardor em coração firme nascido
Gregório de Matos

Ardor em coração firme nascido! 
Pranto por belos olhos derramado! 
Incêndio em mares de água disfarçado! 
Rio de neve em fogo convertido! 

Tu, que um peito abrasas escondido, 
Tu, que em rosto corres desatado, 
Quando fogo, em cristais aprisionados, 
Quando cristal, em chamas derretido.

Se és fogo, como passas brandamente? 
Se és neve, como queimas com porfia? 
Mas ai! que andou Amor em ti prudente. 

Pois para temperar a tirania, 
Como quis, que aqui fosse a neve ardente, 
Permitiu, parecesse a chama fria. 

MATOS, Gregório de. Obra poética. 2. ed. Rio de Janeiro: Record, 1990, v. I, p. 514-515. 


O soneto é precedido de um comentário sobre o evento que o motiva, no qual o eu poético observa, em sua amada, a expressão de sentimento em verdadeiras lágrimas de amor. Põe-se, então, a refletir sobre as características paradoxais do amor. O eixo do poema é o jogo dos opostos, figurativamente representados pelo fogo e pela água, pelo calor e pelo frio. 

1. Na primeira estrofe, o eu poético descreve o sentimento que arde no coração da amada (sentimento interno) e que se derrama no pranto que sai de seus belos olhos (expressão externa). Comenta, então, o sentimento e o pranto, combinando-os por meio de figuras antitéticas. Quais? 

Na segunda estrofe, trabalha a mesma figuração antitética entre o interno e o externo, entre o ardor e o pranto. Dirige-se diretamente ao Amor (que abrasa escondido um peito e corre desatado pelo rosto) para concluir que, quando é fogo, está aprisionado em cristais (ardor interno) e quando cristal, em chamas se derrete (o ardor se transforma em pranto). 

2. Na terceira estrofe, a mesma figuração volta, mas agora o eu poético está se perguntando como esse sentimento é possível. Que perguntas levanta o eu poético? 

3. O eu poético conclui a terceira estrofe com a constatação de que o Amor andou afetando a amada com prudência pois - diz ele já na quarta estrofe - para temperar sua tirania o Amor fundiu os opostos. Como está expressa essa ideia? 


GABARITO

1. Incêndio disfarçado em mar de águas; rio de neve convertido em fogo.

2. Se é fogo, como passas brandamente? / Se é neve, como queimas com porfia?

3. Qualifica a neve e o fogo por adjetivos contrários: neve ardente e chama fria.