18 de abril de 2017

Fernando Pessoa, o novo poeta da pátria portuguesa - Interpretação do poema Mensagem


O novo poeta da pátria portuguesa 

Os vários heterônimos de Fernando Pessoa, com suas visões particulares, refletem múltiplas possibilidades de compreender o mundo e mostram a complexidade do espírito humano. Os heterônimos podem ser entendidos como faces da personalidade de Fernando Pessoa, que se misturam, se contradizem e dão fim à ideia de que pudéssemos ser um bloco monolítico, uniforme, coeso, harmônico, decifrável. 
O criador dessas almas tão diferentes entre si também assinou uma importante obra como Fernando Pessoa. Trata-se de Mensagem, longo poema de saudação à pátria portuguesa. Esse poema épico moderno é dividido em três partes: "O brasão", "Mar português" e "O encoberto". Na primeira, inspirado nas partes que compõem o brasão da nobreza portuguesa, o poeta conta a formação do Estado português; a segunda parte é dedicada à conquista do mar; e a terceira trata do declínio da nação e da previsão do renascimento da grandeza lusitana. 
A obra Mensagem, publicada em 1934, foi escrita durante 21 anos. É com esse cuidado extremado que Fernando Pessoa trata da história e do espírito de Portugal, estabelecendo algumas vezes diálogo com a maior epopeia lusitana, Os Lusíadas, de Luís Vaz de Camões. 
Na segunda parte, por exemplo, alguns versos dialogam com o episódio "O velho do Restelo", de Os Lusíadas. Para aquele enérgico velho que assiste à partida das naus no século XV, não valiam a pena os sofrimentos causados por mortes, graves ferimentos e desaparecimento de centenas de portugueses que se arriscavam no mar. Entretanto, para Fernando Pessoa, todos os padecimentos foram recompensados pela dominação dos mares por Portugal, na época. 

Leia estes versos da segunda parte de Mensagem que fazem lembrar Os Lusíadas, de Camões.

Ó mar salgado, quanto do teu sal 
São lágrimas de Portugal! 
Por te cruzarmos, quantas mães choraram, 
Quantos filhos em vão rezaram! 
Quantas noivas ficaram por casar 
Para que fosses nosso, ó mar! 

Valeu a pena? Tudo vale a pena 
Se a alma não é pequena. 
Quem quer passar além do Bojador 
Tem que passar além da dor. 
Deus ao mar o perigo e o abismo deu, 
Mas nele é que espelhou o céu. 

Fernando Pessoa. In Obra poética (com atualização ortográfica). Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1986, p. 82. 


Bojador: cabo na costa ocidental da África; até 1534 era o limite atingido pelos navegadores; no poema de Fernando Pessoa, simboliza, assim, o limite do conhecimento.


1. Para representar o intenso sofrimento do povo português durante a expansão marítima, Fernando Pessoa cria uma imagem hiperbólica, exagerada. Transcreva os versos que apresentam essa imagem. 

2. Na avaliação que o poeta faz a respeito da conquista dos mares, o saldo é positivo, como se lê em "Tudo vale a pena / Se a alma não é pequena". De acordo com os versos da segunda estrofe, por que se pode afirmar que os portugueses não têm alma pequena? 

Para responder às questões a seguir, leia os versos finais de Mensagem, em que Fernando Pessoa mais uma vez dialoga com Camões.

Nem rei nem lei, nem paz nem guerra, 
Define com perfil e ser 
Este fulgor baço da terra 
Que é Portugal a entristecer [...] 

Ninguém sabe que coisa quer. 
Ninguém conhece que alma tem, 
Nem o que é mal nem o que é bem. 
(Que ânsia distante perto chora?) 
Tudo é incerto e derradeiro. 
Tudo é disperso, nada é inteiro. 
Ó Portugal, hoje és nevoeiro... 

É a Hora! [...] 

Fernando Pessoa. In Obra poética (com atualização ortográfica). Rio de Janeiro: ova Aguilar, 1986, p. 89.

3. Como o poeta caracteriza Portugal nos versos finais de Mensagem? 
4. Identifique no texto uma metáfora, referente a Portugal, e explique seu sentido simbólico. 



Gabarito

1. “Ó mar salgado, quando do teu sal / São lágrimas do Portugal!”

2. O eu lírico declara que os portugueses lançaram-se a um grande desafio pois desafiaram o limite do conhecimento humano da época. Por esse efeito de bravura desmedida, os portugueses não têm alma pequena.

3. O eu lírico, no final de Mensagem, descreve Portugal como um país triste sem perspectiva ou sonhos, estagnado.

4. A metáfora “fulgor baço da terra” expressa simbolicamente o poder e a glória de Portugal que estão, no momento em que o poeta escreve, ocultos, um tanto esquecidos, já que predomina a estagnação do Estado português.