21 de setembro de 2016

O meu olhar é nítido como um girassol (análise)


O meu olhar é nítido como um girassol 

O meu olhar é nítido como um girassol. 
Tenho o costume de andar pelas estradas 
Olhando para a direita e para a esquerda, 
E de vez em quando olhando para trás... 
E o que vejo a cada momento 
É aquilo que nunca antes eu tinha visto, 
E eu sei dar por isso muito bem... 
Sei ter o pasmo comigo 
Que tem uma criança se, ao nascer, 
Reparasse que nascera deveras... 
Sinto-me nascido a cada momento 
Para a eterna novidade do mundo... 

Creio no mundo como num malmequer, 
Porque o vejo. Mas não penso nele 
Porque pensar é não compreender... 

O Mundo não se fez para pensarmos nele 
(Pensar é estar doente dos olhos) 
Mas para olharmos para ele e estarmos de 
acordo.  
Eu não tenho filosofia: tenho sentidos... 
Se falo na Natureza não é porque saiba o que 
ela é, 
Mas porque a amo, e amo-a por isso, 
Porque quem ama nunca sabe o que ama 
Nem sabe por que ama, nem o que é amar... 
Amar é a eterna inocência, 
E a única inocência não pensar... 

CAEIRO, Alberto. O meu olhar é nítido como  um girassol. In: PESSOA, Fernando. PoesiaAlberto Caeiro. São Paulo: Companhia das Letras, 2001. p. 26. 

1. Identifique a temática desenvolvida no poema. 

2. Relacione essa temática à poesia de Alberto Caeiro. 

3. Explique o sentido de "pasmo", presente no verso "Sei ter o pasmo comigo". 

4. Interprete o verso" pensar é estar doente dos olhos", considerando o contexto do poema. 

5. Aponte duas características marcantes da escrita de Alberto Caeiro e identifique-as no poema. 


Gabarito

1. O poema desenvolve a ideia de que os olhos são os órgãos responsáveis pela apreensão direta e sensível do mundo, a qual deve basear-se principalmente no empirismo, ou seja, na experiência e na observação. 

2. O poema apresenta a temática característica de Alberto Caeiro, que, segundo a biografia criada por Fernando Pessoa, teve apenas instrução primária e viveu sempre muito próximo à natureza. O poema, relacionado ao universo bucólico, apresenta uma lógica bastante objetiva e mediada pelas sensações. 

3. "Pasmo" pode ser compreendido como a admiração e o encantamento decorrentes da incessante descoberta da novidade do mundo. Trata-se de uma abstração, relacionada à ideia de Caeiro de que o mundo se renova a cada novo olhar lançado sobre ele. 

4. O verso condensa a perspectiva de Caeiro sobre a vida, pautada pela eterna descoberta do mundo. Em sua perspectiva, a relação com a vida deve ser simples e prescindir de racionalização. Daí a ideia de que os olhos são os órgãos responsáveis pela apreensão direta do mundo. 

5. As características são o bucolismo, presente em versos como" O meu olhar é nítido como um girassol" e "Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é, / Mas porque a amo, e amo-a por isso", e o empirismo, presente em "Eu não tenho filosofia; tenho sentidos... ".